Depois de uma carreira no mundo editorial, Richard Somogyvari aventurou-se pelo turismo no final dos anos 1990 mesmo a tempo de enfrentar uma das maiores crises do mercado: a bolha da internet de 2000. Um período desafiante para muito empreendedores, esta crise deixou Richard sem nada para além do seu amor às viagens e aos negócios. Deste desafio surgiu um impulso para inovar e Richard Somogyvari desenvolveu uma nova ideia de negócio – uma ideia que, 15 anos depois, se tornou numa empresa internacional com mais de 300 trabalhadores e filiais em seis países. Esta semana, conversámos com o Richard para aprender mais sobre o seu percurso no setor do turismo e quais os conselhos que tem para superar os desafios da crise atual.


1. O Richard esteve tantos anos a trabalhar em turismo. O que é que o atraiu a este setor inicialmente?

Eu sempre gostei de viajar. Tudo começou depois do secundário quando fui aos Estados Unidos com um passe de viagens ilimitadas que existia no início dos anos 80. Fiquei impressionado com o mundo enorme que existia lá fora, tão diferente da pequena vila sueca onde tinha crescido. A partir daí, a minha vida girava à volta de trabalho, poupar e viajar para viver mais uma aventura. Fui o mais longe que pude e visitei ilhas no Pacífico Sul, depois fui até à Ásia, Austrália, África. Fiz várias amizades e continuei assim durante uns anos até a minha vida estabilizar um pouco. Mas ainda assim, viajava sempre que possível. Estava viciado! No final, acabei por me casar por outra viciada em viagens, decidimos “viajar de forma permanente” e trocámos a Suécia pela África do Sul de vez.

2. Conte-nos um pouco mais sobre o seu percurso no mundo do turismo. Como é que começou e como é que chegou aonde está hoje?

Depois de alguns anos no meu anterior ramo, que era edição, fui levado para o setor do turismo pelo meu irmão que já trabalhava na área na Suécia e juntos estabelecemos uma sucursal da sua empresa na África do Sul. Estávamos na idade de ouro da internet no fim dos anos 90 e tudo era possível. No entanto, em meados de 2001, os investidores começaram a desaparecer com a bolha da internet a espalhar-se pelo mundo inteiro. Isto suspendeu as nossas vidas pois deixámos de ter rendimentos e estávamos do outro lado do mundo. No entanto, tanto eu como a minha mulher não tínhamos qualquer interesse em voltar ao frio da Suécia e por isso eu fiz um acordo com uma empresa de viagens norueguesa para conseguir uma licença sul africana. O negócio deles era vender excedentes de inventário hoteleiro a grandes descontos através de clubes exclusivos. Eu gostei da ideia porque era o casamento perfeito dos meus interesses em viagens e negócios. Por isso agora podia fazer as duas coisas: viajar sempre que queria e tentar criar um negócio ao mesmo tempo. Para além disso, eu sempre gostei de negociar – nunca gostei de pagar o preço de venda e regatear é como um desporto para mim. E bem, este modelo era todo sobre negociação por isso ainda se juntou mais um terceiro interesse ao casamento. O negócio foi crescendo e depois de 15 anos tinha 350 trabalhadores em seis países a fazer o mesmo. Mas tinha-se tornado demasiado grande para ser divertido pois 90% do meu trabalho era gerir as minhas equipas. Esse é um aspeto importante de qualquer empresa de sucesso, mas é quase outro trabalho só por si e eu era demasiado impaciente para o fazer bem. Preferia fazer acordos e criar conceitos para depois os concretizar e passar para o próximo. Por isso, senti que tinha levado o negócio o mais longe que podia e decidi vender enquanto ainda tinha algum ímpeto do meu lado. Nunca me arrependi desta decisão, mas por vezes sinto falta daquela ação e da companhia de alguns ótimos colegas.

3. A indústria do turismo está a enfrentar um dos seus maiores desafios até hoje. Quais são as soluções mais inovadores que tem visto no setor para responder à pandemia da COVID-19?

Tenho visto um misto de respostas à pandemia no setor, apesar de também já não estar tão ligado como quando trabalhava a tempo inteiro. Até agora não tenho visto nada de destaque em termos de inovação, mas diria que esta crise veio revelar o melhor de muitos empreendedores que têm vindo a criar planos para sobreviver. Quando a única preocupação é sobrevivência, as pessoas tornam-se bastante criativas e deixam de lado aqueles projetos mais fúteis. Nos próximos anos, a migração para o online (e aqui incluo tudo o que está relacionado com IT) será ainda mais rápida e irá acabar com as formas antigas de fazer as coisas. Para quê gastar dezenas de milhares de dólares em viagens quando agora sabemos que podemos fazer muito por uma fração do tempo e do preço através do Zoom? Para quê voltar a ter cinco pessoas a fazer coisas de back-office quando podemos automatizar tudo e ter apenas uma pessoa a supervisionar de forma mais barata? Por isso, acho que a crise irá acelerar a adoção das novas tecnologias já existentes pelas empresas sobreviventes – é simplesmente o que faz sentido. E isto vai alargar-se a todos os aspetos desde como nos encontramos com os nossos clientes a tarefas de back-office, formação de staff, marketing e muito mais.

4. E falando de COVID-19, quando é que acha que veremos as viagens a retornar em números mais significativos e como acha que as viagens serão diferentes?

Os eventos do último ano não têm precedente e por isso é difícil dizer com certeza quando voltaremos à normalidade (seja lá o que isso for). Muitos acreditam que voltaremos ao normal quando as vacinas forem distribuídas, mas eu não tenho tanta certeza. Há um ano, os representantes eleitos e autoeleitos deste mundo disseram-nos que precisávamos de aplanar a curva com confinamento durante umas semanas e que depois disso tudo voltaria ao normal – um ano depois, não me parece que tenhamos voltado ao normal.

Esta situação muda constantemente: num dia as máscaras são boas, no outro já não e depois de repente precisamos de pelo menos três máscaras; um país não aceita uma determinada vacina para a sua população, só a outra; entretanto as vacinas são anunciadas como a bala de prata mas depois precisamos de continuar a manter o distanciamento social e usar máscaras; confinar, desconfinar e confinar outra vez enquanto outro país faz exatamente o oposto; passaportes de vacina obrigatórios ou certificados de saúde ou nada… a lista de questões continua. Como é que podemos fazer qualquer previsão neste ambiente tão fluido? E enquanto estamos todos focados no vírus há uma possível crise financeira iminente devido às quantidades incríveis de dinheiro que têm sido impressas para apoiar as economias globais. Há tantas variáveis a considerar agora que acho que qualquer previsão sobre o futuro é especulativa. Bem pode demorar uns cinco anos até estarmos sequer perto dos níveis de viagens que vimos no início de 2020, mas espero estar completamente errado e que tudo volte ao normal em outubro.

De qualquer maneira, a única coisa acertada a fazer agora é focar no que temos à nossa frente. Se têm um negócio que foi dizimado pela crise, comecem a pensar como uma start-up 2.0 com o benefício de já saber que erros não cometer. Se têm a sorte de terem sido poupados aos efeitos da crise, tomem dois ou três passos agressivos para a frente. Olhem para os pontos positivos à vossa volta; as oportunidades rodeiam-nos, mas as nossas mentes tendem a ser um pouco fechadas. Quando todos estão meio deprimidos, é uma ótima altura para negociar por isso usem esta altura para conseguir coisas de forma mais barata. Se não têm cash estejam disponíveis para fazer uma troca dos vossos ativos por coisas que precisem e lembrem-se que têm mais ativos do que pensam – inventário antigo, um escritório extra, tempo extra, talento, contactos, reputação, ideias ou o que seja podem ser trocados por aquilo que vocês precisam. Esta é a altura de ser criativo. Daqui para a frente, as coisas serão um pouco diferentes dos sonhos que tínhamos no início de 2020, mas isso pode não ser assim tão mau.

5. Por fim, dada a sua experiência vasta no setor, que conselhos tem a dar às start-ups de viagens neste momento?

Qualquer pessoa que esteja a pensar em criar uma start-up de viagens (ou em qualquer setor) tem de começar por perguntar-se porque é que o vai fazer. O que é que oferecem que as outras empresas não oferecem já? O que é que vos distingue, vos torna diferente e especial? E isso deve ser algo para além de vocês próprios, caso contrário a ideia não passará de uma oportunidade de autoemprego para um negócio escalável e que vos gera dinheiro enquanto dormem ou vão de férias. Por isso, é importante começar por alguma introspeção crítica. Se continuam a acreditar que têm algo que conseguem fazer melhor do que os outros e que oferece valor real que convença as pessoas a gastar dinheiro nos vossos serviços então criem um plano simples com uma calendarização e escrevam-no de forma a que uma criança de 12 anos consiga compreender. Assegurem-se de que têm financiamento suficiente, mas não a mais pois esse tipo de excessos nunca ajuda e as limitações obrigam-nos a encontrar as soluções mais eficazes. Depois, prevejam que tudo custará o dobro e levará pelo menos o dobro do tempo.

Se conseguem suportar essa realidade e aceitar potenciais perdas de dinheiro, tempo e reputação caso as coisas não deem certo, então tomem os primeiros passos e não pensem demasiado nas coisas. Nunca saberão como as coisas vão correr até tentar e à medida que as coisas mudam, uma impossibilidade numa fase parecerá a coisa mais fácil noutra altura ou vice-versa. Precisam mesmo de se entregar e ir até ao fim fazendo os ajustes necessários durante o caminho (e preparem-se para muitos ajustes). Devido às várias dificuldades de começar e gerir um negócio, ajuda se gostam muito (ou, melhor ainda, são obcecados) pelo que fazem pois atravessarão períodos difíceis e começar um negócio apenas pelo dinheiro fácil sem inconvenientes não chega. Desculpem – criar um negócio é uma forma de autotortura às vezes porque os sacrifícios que vão ter de fazer são muito reais. Contudo, o retorno será fantástico e irá além do que esperam. A vida acontece, nós mudamos, crescemos. Boa sorte com os vossos projetos!


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— Entrevista por Inês Pinto